Pandemias, como a de coronavírus, não são um fenômeno novo. Olhando para o passado, há exemplos de outras doenças que atingiram o mundo e tiveram efeitos em diferentes áreas da sociedade. Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) busca justamente traçar paralelos entre esses momentos com o que é vivido atualmente para compreender comportamentos da população e de autoridades frente às pandemias. O projeto Mais História, por favor! nasceu ainda em 2019 no Laboratório de Observação dos Usos Públicos do Passado (Louppa), vinculado ao curso de História e coordenado pelo professor João Malaia.
- A ideia é criar conteúdos para um público maior, a partir de pesquisa com metodologias da história, mas com acesso maior que pesquisas acadêmicas. Como eu não sou especialista da área da saúde, pedi apoio à colega Beatriz Teixeira Weber, que estuda isso, e ajudou a montar o projeto e dá dicas de para onde seguir - conta Malaia.
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O que aglomeração e isolamento tem a ver com contágio e número de mortes, ontem e hoje? Nessa thread a gente vai contar sobre aglomerações que aconteceram na cidade do Rio de Janeiro durante a ascensão da curva de mortes em 1918.
- Mais História, por favor! podcast (@maishistoriapf) 6 de abril de 2020
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Com a suspensão das atividades presenciais na UFSM, a proposta feita aos estudantes foi a pesquisa sobre a Gripe espanhola e a produção de conteúdo, como threads (conjunto de tweets em sequência) no Twitter e podcasts. O tema veio após a percepção de que especialistas da saúde pública mencionavam a pandemia de Gripe espanhola, mas com pouco foco nos comportamentos da sociedade.
- Especialistas traziam a Gripe espanhola para explicar o agora, a curva da pandemia. Ao observar o que é produzido e essa popularização da Gripe espanhola, a gente vê falar muito no medo da pandemia, no número de mortes e pouco na compreensão de comportamentos sociais - explica.
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A pandemia ocorrida entre 1918 e 1920 foi escolhida por atingir, assim como o coronavírus, a todo mundo e ter mais registros já que é uma das mais recentes. A partir da análise, é possível traçar paralelos históricos a níveis social, econômicos, políticos, culturais e de saúde pública.
- O que a gente percebe é que, frente ao desconhecido da pandemia, temos comportamentos conflitantes na sociedade, autoridades não percebendo a gravidade do problema, não tomando medidas necessárias com antecipação. Também vemos crises políticas entre o governo federal e estadual naquela época. Não havia Ministério da Saúde, era a Direção Geral de Saúde Pública, e o diretor, que era o Carlos Seidl, foi muito criticado, acabou pedindo demissão, sendo substituído logo na fase mais crítica e inicial da pandemia - exemplifica.
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Ao todo, são 28 pesquisadores envolvidos, sendo 21 da graduação, quatro da pós-graduação da História, um da pós-graduação da Comunicação Social - responsável pela divulgação do projeto - e os dois professores. O Mais História publica um episódio do podcast por semana. O primeiro foi com a participação da professora Beatriz Weber sobre a Gripe espanhola. Os próximos ainda vão envolver outras doenças e contar com mais participações, como o professor Adrián Carbonetti, da Universidade Nacional de Córdoba, da Argentina, que pesquisa sobre pandemias no país. Além dele, os professores da graduação e pós-graduação da História da UFSM Francisco Mendonça, Semiramis Silva e Nikellen Witter vão participar. Eles devem contribuir com pesquisas sobre outras doenças, como a Peste Negra (que aconteceu na Idade Média), a Peste antonina
(ocorrida na Roma Antiga) e o cólera. Inicialmente, o objetivo do projeto é a produção para as mídias sociais. Porém, tudo isso deve virar produção acadêmica no futuro.
- Nosso foco é produzir o material para discussão mais ampla da percepção da Gripe espanhola e os paralelos que podemos traçar com ela. No futuro, o material será submetido a revistas, em duas publicações diferentes: uma abordando a Gripe espanhola em si e o processo que a gente consegue recontar e a outra sobre os usos públicos do passado - explica Malaia.
O professor alerta para o cuidado em comparar os períodos. Segundo Malaia, é importante reiterar que os momentos têm características diferentes. A ideia, contudo, é observar essas diferenças e as semelhanças para compreender o que pode nos ajudar agora.
*Colaborou Leonardo Catto